quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Dos tempos de felicidade

Claramente a felicidade não pode durar muito tempo. Se no passado sempre fomos mais felizes que no presente, quando constatamos que somos felizes agora, será então por momento e não será tão perceptível que a felicidade já não é mais a mesma pelo tempo que ainda cremos plenamente nela ou na volta dela; é então que já começa a queda em linha levemente inclinada, mas só a percebemos quando já estamos jogados ao chão.

Durante a queda tudo tem uma face ilusória, para não dizer mágica ou fantasiosa (é assim que vemos tudo quando ainda não percebemos a queda). Temos o começo da queda no momento que estamos cientes que somos felizes há tão pouco tempo que cremos que voltaremos ao estado do qual saímos embriagados; sutil ilusão, a felicidade é um momento, o que dura depois é ilusão sob o nome de nostalgia. A felicidade plena é como um raio, e só a percebemos quando ouvimos o trovão, depois disso é somente a espera por outra luz (ou flash) no meio do temporal da vida.

Ah, as sutilezas que vivemos, sem perceber que a tempestade está cada vez mais furiosa. Pequenas distrações e efemeridades que não me fizeram crer na emergência do nefasto temporal. Esse clima de tempo fechando era presente em intervalos regulares, mas depois vinha certo alívio de saber que a nuvem negra não aprecia tão fatal, mesmo com o aumento de sua forma ameaçadora; era a sensação que estava tudo bem e isso me dava todos os tipos de prazeres: do mais leve alívio, passando para um êxtase até os picos de excitação.

Do sonho ao porre

Cada porre me adoece mais
A mente longe de distorções
É insana ante esta realidade a ser mudada
Que anda como lesma e seu rastro pegajoso nos prendem
Distrai nossas vidas a não se importarem
Então nada mais precisa mudar, pois é festa!

Estou doente e a cada porre eu pioro
Não consigo fingir que não existem tanta coisa insuportável
Quero o mundo de meus sonhos agora!
Machismos, mulheres sendo comidas, corpos intocados dançam frenéticos
Separam o amor do sexo, as mulheres não gozam e sentem-se dominadoras de mentes masculinas que no subterfúgio da sedução mantém seus vícios
Ainda somo medievais, poeta do roquenrou! E sem piedade!

Cada porre e minha mente está se despedaçando, parece morte mas não é
Ela se fragmenta e eu vou entregando os estilhaços e esquecendo tudo que sonhei
Este mundo é o que existe, mas eu quero aquele outro!
Sempre me lembro disto e adoeço mais ao ver que já na madrugada o mundo ainda é o mesmo
Eu, por um breve momento, esqueci o sonho para viver o porre.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Distraído pelo jazz

Sim, é isto mesmo que só o jazz e mais nada, nem alguém, faz comigo. Isto não tem nome. São umas sensações meio ansiosas, meio embriagadas, devaneios transgridem e uma vibração acomete o peito deixando os sentidos atordoados.
Logo começo a ficar tão lúcido, pois sei muito bem o que cada instrumento está falando. Não há mais nada se não estas vozes. Estou bem desperto para o que tem a falar.
Nenhuma outra voz foi tão clara e sincera quanta esta que em seu sopro não atinge direto meus ouvidos para me conquistar. E sim vibra por todo o ar, envolvendo toda minha pele arrepiada no pulsar do coração desta canção.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Das crônicas dos jovens escritores

Ele sentou no sofá segurando uma lata de cerveja. Cruzou as pernas e bem acomodado soltou o corpo se afundando entre as almofadas. Permaneceu deste modo e seu olhar fixo em um ponto que só existia em sua imaginação. Entre um gole e outra levantava uma das mãos e suavemente mexia os dedos lentos. Em um movimento levantou-se sem se preocupar que me assustou e disse “Preciso escrever”. Já sabia onde guardava as folhas e canetas (na aposentada escrivaninha ao lado do sofá), abriu a gaveta, pegou o que precisava e foi até o parapeito da janela para se apoiar em pé e finalmente olhar fixamente o papel todo branco enquanto rodopiava a caneta entre os dedos esperando o momento certo de abri-la e deixar tudo escorrer de sua imaginação manchando o branco como se fosse um pintor.
Não tardou a escrever sem cessar. É tão belo esse impulso criativo e tão dele que não conseguia me aproximar e até evitava olhar porque, quando fazia, ficava tão inquieta quanto ele. Em um par de minutos preencheu toda a folha com inúmeras linhas azuis espremidas quase caóticas. Preenchida toda a primeira folha ele a dobra até caber no bolso do paletó e lá a deixa repousar por toda a noite, até tirar a vestimenta em seu quarto.
Tão curiosa e atraída (já não por ele, mas sim pelo mistério que era aquela folha toda marcada de tinta) pergunto se posso ler seu mais novo escrito, levo um arrogante “Ainda não, logo publicarei” e o dito não me surpreende, pois a contragosto percebi que era vã a vontade de ver algo que ainda não chegou hora de ser exposto.
Eu, então, era uma jovem escritora, novata na arte e neófita nesta forma de criação. Estava começando a entender sobre a nudez que ele revelava em seus escritos e nem sempre era a nudez dele que se revelava. Tempos depois lhe perguntei por que escrevia, respondeu “Porque a vida, este mundo, não são flores. Mas escrevo sobre elas.” Mesmo compreendendo como era ser escritor de seu ponto de vista, nada aprendi com ele, nada ele me passou de inspiração.