terça-feira, 4 de outubro de 2011

Das crônicas dos jovens escritores

Ele sentou no sofá segurando uma lata de cerveja. Cruzou as pernas e bem acomodado soltou o corpo se afundando entre as almofadas. Permaneceu deste modo e seu olhar fixo em um ponto que só existia em sua imaginação. Entre um gole e outra levantava uma das mãos e suavemente mexia os dedos lentos. Em um movimento levantou-se sem se preocupar que me assustou e disse “Preciso escrever”. Já sabia onde guardava as folhas e canetas (na aposentada escrivaninha ao lado do sofá), abriu a gaveta, pegou o que precisava e foi até o parapeito da janela para se apoiar em pé e finalmente olhar fixamente o papel todo branco enquanto rodopiava a caneta entre os dedos esperando o momento certo de abri-la e deixar tudo escorrer de sua imaginação manchando o branco como se fosse um pintor.
Não tardou a escrever sem cessar. É tão belo esse impulso criativo e tão dele que não conseguia me aproximar e até evitava olhar porque, quando fazia, ficava tão inquieta quanto ele. Em um par de minutos preencheu toda a folha com inúmeras linhas azuis espremidas quase caóticas. Preenchida toda a primeira folha ele a dobra até caber no bolso do paletó e lá a deixa repousar por toda a noite, até tirar a vestimenta em seu quarto.
Tão curiosa e atraída (já não por ele, mas sim pelo mistério que era aquela folha toda marcada de tinta) pergunto se posso ler seu mais novo escrito, levo um arrogante “Ainda não, logo publicarei” e o dito não me surpreende, pois a contragosto percebi que era vã a vontade de ver algo que ainda não chegou hora de ser exposto.
Eu, então, era uma jovem escritora, novata na arte e neófita nesta forma de criação. Estava começando a entender sobre a nudez que ele revelava em seus escritos e nem sempre era a nudez dele que se revelava. Tempos depois lhe perguntei por que escrevia, respondeu “Porque a vida, este mundo, não são flores. Mas escrevo sobre elas.” Mesmo compreendendo como era ser escritor de seu ponto de vista, nada aprendi com ele, nada ele me passou de inspiração.

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